Na pele dos ministros

A construção dos votos no Supremo Tribunal Federal

Publicado em 10 dez. 2020. Última atualização em 10 dez. 2020
DESCRIÇÃO DA ATIVIDADE

Ementa: 

As metodologia propostas foram: método do caso, role-playing e seminários. Inicialmente, a sala de aula foi organizada de forma a simular julgamentos de casos concretos apreciados pelo Supremo Tribunal Federal, permitindo aos alunos que, por meio do estudo de um caso, pudessem construir um raciocínio jurídico-constitucional. Posteriormente,  eram realizados seminários de modo a estabelecer um estranhamento com os alunos acerca das práticas ocorridas na simulação de julgamento.

 

Prêmio Destaque na 3ª Edição do Prêmio Esdras de Ensino do Direito (2020).

Atividade sem revisão pelo autor.

Objetivo: 

OBJETIVOS GERAIS: O curso oferecido tinha o propósito de colaborar com um refinamento do olhar à prática jurídica existente em um órgão colegiado de julgamento, como o STF, além de proporcionar o conhecimento de diferentes habilidades em algumas carreiras jurídicas atuantes no Supremo Tribunal Federal (a penas aquelas que surgiram nas atividades), como poder de convencimento, argumentação, redação, síntese dos fatos e identificação dos principais problemas a serem enfrentados. Para tanto, a disiplina foi pensada e organizada de modo a simular práticas o mais semelhante possível às dinâmicas encaradas pelos ministros no processo que envolve o ato de julgar. O que pode ser resumidamente notado da seguinte forma:

  • a leitura de processos, a sua compreensão e a consequente elaboração de um relatório permite o aluno: (i) se aproximar um pouco mais aos fatos e Direitos a serem apreciados, (ii) desenvolver seu poder de síntese ao redigir textos; (iii) identificar a questão central a ser enfentada no processo;
  • redigir e apresentar oralmente o voto na sessão de julgamento permite o aluno: (i) estimular habilidades de dicção, retórica e oratória; (ii) ampliar seu senso crítico sobre as questões discutidas; (iii) pensar estratégias de alcance de seu discurso; (iv) preparar-se para enfrentar possíveis apartes e discordâncias ao voto por ele manifestado; (iv) perceber a importância do voto para o alcance de uma decisão;
  • compor um corpo de magistrados aptos a manifestar votos e tomar decisões permite o aluno: (i) desenvolver habilidades de escuta e fala entre seus pares e as partes envolvidas no processo; (ii) observar atos e fatos capazes de estimular a construção de uma maioria em plenário; (iii) sentir as dificuldades inerentes ao ato de julgar;
  • atuar como parte no processo, como Amicus Curiae ou participante de Audência Pública permite o aluno: (i) pensar estratégias de convecimento dos magistrados; (ii) identificar elementos capazes de infuenciar a dinâmica decisória e se aproprir deles em seus discursos; (iii) pesquisar decisões judiciais, autores e textos que possam convencer os magistrados de que o seu argumento é melhor; (iv) observar o ambiente e criar formas de constranger os magistrados a votarem de determinada forma tal qual é feito em uma sessão real de julgamento;
  • ter acesso a acórdãos e processos permite o aluno: (i) ampliar  o seu contato com a prática judiciária a partir de eventos que provocam e instruem o ato de julgar e produzir direitos; (ii) discutir criticamente conceitos jurídicos, teorias, regras e práticas que impactam tanto no fato analisado quanto no direito discutido; (ii) refletir as formas de produção de verdades judiciárias a partir de todo o contexto ao qual fez parte;
  • ler pesquisas empíricas no e sobre o Direito e apresentar seminários permite o aluno: (i) atribuir um olhar mais sensível às dinâmicas decisórias e identificar os diferentes papéis exercidos neste processo; (ii) observar e descrever fatos capazes de instruir a organização pragmática do espaço destinado à discussão e deliberação; (iii) refletir criticamente sobre as teorias e dogmas estudados no Direito a partir das práticas judiciárias; (iv) perceber o processo de racionalização jurídica de sentimentos, valores, intuições, bem como a sua incorporação em votos e decisões; (v) compreender o papel da pesquisa, sobretudo empírica, para o estudo do Direito e percepção da realidade social; (vi)  reler textos, autores, decisões judiciais, teorias, dogmas e doutrinas a partir do senso crítico estimulado e radicalizado pela pesquisa empírica.

 

HABILIDADES A SEREM DESENVOLVIDAS:  Ao longo do curso, as seguintes hanilidades e competências foram trabalhadas: (a) a construção de um raciocínio jurídico-constitucional, (b) o conhecimento e compreensão de conceitos condutores do debate, (c) a apreensão de ideias capazes de influenciar a dinâmica decisória, (d) o estímulo ao desenvolvimento de habilidades necessárias ao exercício da prática jurídica, (e) confrontar o dever ser jurídico com a realidade social e (f) perceber a importância de atividades de pesquisa e as habilidades que são capazes de oferecer aos operadores do Direito.

 

CONTEÚDOS TRABALHADOS: 

Por ser um curso de 60h, sendo todo ele conduzido na dinâmica aqui descrita, vários conteúdos foram trabalados, como:

AULA 1: Apresentação do curso, da dinâmica das aulas e da forma avaliativa. Exposição de forma abrangente do programa do curso: apresentação breve das questões que poderão surgir nos debates.
Leitura obrigatória:
MENDES, Conrado Hübner. Onze Ilhas. Folha de São Paulo: Tendências e Debates, São Paulo, 01.02.2010, disponível em: <http://avaranda.blogspot.com/2010/02/conrado-hubner-mendes.html>.

 

Bloco I: Transição e consolidação democrática do Estado de Direito: ativismo e supremacia do Poder Judiciário brasileiro - aulas 2 a 4.

EMENTA: Este bloco discutirá a mudança de atuação do Poder Judiciário brasileiro a partir, principalmente, das mudanças de competências introduzidas pela Constituição Federal de 1988. Isto é, o foco das discussões será o da transição do Estado de Direito e da sua consolidação democrática, tendo em vista as mudanças institucionais e políticas sofridas pelo Poder Judiciário.

AULA 2: Impeachement do Presidente Collor: movimentos políticos na construção de um voto no Supremo Tribunal Federal.
EMENTA: Julgamentos de Atos do Poder Público. Movimentos políticos e opinião pública.
CASO GERADOR: Impeachement do Presidente Collor: MS/DF 21.564-0, Rel. Min. Octávio Gallotti, Plenário, Data do Julgamento: 23/09/1992.
Leitura obrigatória:
NOBRE, Marcos. Pensando o impeachment. In Novos Estudos, CEBRAP, n.º 34, ano 1992, p. 15-19.
Entrevista com o Prof. Luiz Werneck Vianna, 2015. Disponível em:
<http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/539830-segundo-governo-dilma-uma-....
Reportagem do Jornal O Globo, disponível em:
<http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/coberturas/impeachmen....

AULA 3: Entre o segredo de Estado e a busca da verdade real: limites e legitimidade constitucional das comissões investigativas.
EMENTA: Princípio democrático. Princípio Republicano. Comissão da Verdade: função e limites do poder de investigação.
CASO GERADOR: Lei de Anistia: ADPF n. 153.
Leitura obrigatória:
ARANTES, Rogério Bastos, “Judiciário: entre a justiça e a política”. In Lúcia Avelar e Antonio Octavio Cintra, orgs. Sistema Político Brasileiro. Rio de Janeiro: Fundação Konrad-Adenauer; São Paulo: UNESP, 2004, pp. 79-108.

AULA 4: Ativismo e supremacia judicial no Pós-88: há limites para o STF?
EMENTA: Reforma Agrária. Delimitação de terras indígenas. Voto com condicionantes: ampliação de competências do STF.
CASO GERADOR: Raposa Serra do Sol: Pet. 3.388.
Leitura obrigatória:
VILHENA VIEIRA, Oscar. Supremocracia. Revista Direito GV, São Paulo, v. 4, n. 2, p. 441-463, Dez. 2008. Disponível em: < http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/9674>.

 

Bloco II: Construindo um argumento jurídico sem a comprovação fática - aulas 5 e 6

EMENTA: Mutação Constitucional. Controle difuso de constitucionalidade. Interpretação. Pesquisa empírica em Direito.

Aula 5: Utilizando argumentos empíricos nos julgamentos
Leitura obrigatória:
KANT de LIMA, Roberto; BAPTISTA, Bárbara Gomes Lupetti. O desafio de realizar pesquisa empírica no Direito: uma contribuição antropológica. Disponível em: <http://www.uff.br/ineac/sites/default/files/o_desafio_de_realizar_pesqui....
JÚNIOR, João Francisco Duarte. O que é a realidade. 10ª Ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 2004. Trechos selecionados.

AULA 6: Mutação constitucional do controle difuso: mudança de configuração do sistema de controle de constitucionalidade no Brasil
EMENTA: Conflito de Competência. Mutação e Reforma da Constituição. A utilização da empiria em estudos de Direito Constitucional.
Caso Gerador: Desuso da competência do Senado (mutação constitucional do art. 52, X da CF/1988): Recl. 4335-5/AC.
Leitura obrigatória:
SANTOS, Carlos Victor Nascimento dos. Mutação à brasileira: uma análise empírica do art. 52, X, da Constituição. Revista Direito GV, 2014.
________________________________. STF e mutação constitucional: a ampliação de poderes da Suprema Corte por suas próprias decisões. Trechos selecionados do livro.

 

Bloco III: A ampliação de poderes do STF pelas vias Interpretativas - aulas 7 a 10.

EMENTA: Nesta fase do curso, serão discutidas as formas de ampliação de competência do Supremo Tribunal Federal tendo por base a hermenêutica constitucional, entendida como interpretação do texto normativo, supressão de lacunas e aplicação do Direito. A expansão judicial por vias interpretativas possuem um limite? Quais as suas conseqüências? Estas são algumas das questões a serem enfrentadas nesta fase do curso.

AULA 7: O que o STF decidiu? Discussão de conceitos não-jurídicos que influenciam no processo decisório.
EMENTA: Limites da técnica jurídica. Discussão e compreensão do teor da decisão do STF.
CASO GERADOR: Caso Elwanger: HC 82.424/RS
Leitura obrigatória:
DE SETA, Cristina Gomes Campos. “Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal” ..... Mas, há consenso na construção das decisões Supremo Tribunal Federal? Tese de Doutorado em Direito na Gama Filho, 2012, PP. 10-11, 112-123, 148-156, 162-173.

AULA 8: STF: entre o exercício da função contra-majoritária e a influência de grupos pluralistas
EMENTA: Comportamento judicial. Opinião Pública.
CASO GERADOR: Reconhecimento da união homoafetiva: ADI 4.277.
Leitura obrigatória:
RIBEIRO, Leandro Molhano; e ARGUELHES, Diego Werneck. Preferências, estratégias e motivações: pressupostos institucionais sobre comportamento judicial e sua transposição para o caso brasileiro. Revista Direito e Práxis, v. 4, n. 7, 2013, p. 85 - 121.

AULA 9: O que é realidade?
EMENTA: Realidade Social. Diálogos interdisciplinares.
CASO GERADOR: Interrupção de gravidez de feto anencefálico: ADPF nº 54/DF. Rel. Min. Marco Aurélio. Plenário. Data de julgamento: 20/10/2004. (Simulação de audiência pública)
Leitura obrigatória:
BERGER, Peter L; LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade: tratado de sociologia do conhecimento. Tradução de Floriano de Sousa Fernandes. Petrópolis, Vozes, 1985, PP. 11 – 34.

AULA 10: Quem define o começo da vida?
EMENTA: Debate entre o Direito Civil e o Direito Penal sobre o início da vida. Aproximação do Direito a diferentes saberes. Audiências Públicas. Amicus Curiae.
CASO GERADOR: Interrupção de gravidez de feto anencefálico: ADPF nº 54/DF. Rel. Min. Marco Aurélio. Plenário. Data de julgamento: 20/10/2004. (Simulação de sessão de julgamento)
Leitura obrigatória:
ROCHA, Juliana Lívia Antunes da. O Supremo Tribunal Federal e as audiências públicas. Anais do 38º congresso da ACPOCS. Disponível em: http://portal.anpocs.org/portal/index.php?option=com_content&view=articl...

 

Bloco IV: Qual a legitimidade democrática de um Poder irresponsável? - aulas 11 a 15

EMENTA: No último bloco, objetiva-se discutir a suposta mudança de comportamento político do Supremo Tribunal Federal e a legitimidade democrática de um Poder que não é responsabilizado pelas suas decisões, além da influência da opinião pública no processo decisório.

AULA 11: Soberania Popular versus Regras de processo constitucional: o que deve prevalecer?
EMENTA: Iniciativa para propositura de leis. Soberania Popular. Legitimidade democrática do STF para decidir contra e a favor do clamor popular.
CASO GERADOR: Ficha limpa: ADI n.º 4.578/DF. Rel. Min. Luiz Fux. Plenário. DJ de 09.nov.2011.
Leitura obrigatória:
KOERNER, Andrei. A análise política do Direito, do Judiciário e da doutrina jurídica. In: Constituição e política na Democracia: aproximações entre Direito e ciência política / Daniel Wei Liang Wang, organizador. São Paulo: Marcial Pons, 2013.

AULA 12: Tradições judiciárias no Brasil contemporâneo
EMENTA: Tradições judiciárias. Processo Penal.
Leitura obrigatória:
KANT DE LIMA, Roberto. Sensibilidades Jurídicas, moralidades e processo penal: tradições judiciárias e democracia no Brasil contemporâneo. Revista de Estudos Criminais, v. n.48, p. 7-34, 2013.

AULA 13: STF e Opinião Pública
EMENTA: Teoria do domínio do fato. Autoria.
CASO GERADOR: Mensalão: AP 470, Rel. Min. Joaquim Barbosa.
Leitura obrigatória:
BITENCOURT, Cezar Roberto. A teoria do domínio do fato e a autoria colateral. Artigo publicado no conjur do dia 18 de novembro de 2012.
Entrevista disponível em: <http://www.oabrj.org.br/detalheConteudo/499/Entrevista-do-jurista-alemao....
Reportagem disponível em: <http://www.viomundo.com.br/denuncias/jurista-alemao-repreende-o-stf-pelo....

AULA 14: Inefetividade das decisões do Supremo Tribunal Federal e a necessidade de Diálogo com os demais Poderes de Estado.
EMENTA: Efetividade da decisão do STF. Separação de Poderes.
CASO GERADOR: Fundo de Participação dos Estados: ADI 1.987.
Leitura obrigatória:
BRANDÃO, Rodrigo. Supremacia Judicial versus diálogos constitucionais; a quem cabe a última palavra sobre o sentido da Constituição? Rio de Janeiro: Lumen Júris: Rio de Janeiro, 2012. Capítulo 8 – Quem deve ter a última palavra sobre a Constituição? trechos selecionados: p. 273-278; 326-328.
Reportagem 1:
Disponível em: <http://www12.senado.gov.br/noticias/materias/2011/09/21/gilmar-mendes-su....
Reportagem 2:
Disponível em: <http://www.valor.com.br/politica/2574570/senado-cria-comissao-especial-p....
Reportagem 3:
Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=228971....
Reportagem 4:
Disponível em: <http://www12.senado.gov.br/noticias/materias/2013/06/26/aprovado-pelo-se....

AULA 15: Essa aula será utilizada para fechar pontos que ficaram em aberto e para dialogo como os alunos sobre os dilemas e dificuldades enfrentados durante o processo decisório ao longo do curso.
Leitura obrigatória:
Silva, Virgílio Afonso da. Deciding without deliberating. International Journal of Constitutional Law, v. 11, p. 557-584, 2013.

 

Bloco V: Na pele dos Ministros: construindo um Tribunal Supremo - aula 16

EMENTA: Separação de poderes. Definição de competências.

AULA 16: Separação de poderes e definição de competências.
CASO GERADOR: o professor elaborará um caso em que os alunos se verão na condição de julgar os atos do Supremo Tribunal Federal

Dinâmica: 

MÉTODO DE ENSINO:  Role playing, método do caso e seminários temáticos.

 

PREPARAÇÃO DOCENTE PRÉVIA: O professor deverá (i) ler todo o material que será discutido em sala de aula, o que inclui casos, relatórios, processos e artigos científicos; (ii) formular perguntas capazes de direcionar o debate, caso as abordagens propostas não surjam naturalmente ou elas sejam desviadas pelos próprios alunos; (iii) estar preparado para cooperar com seus alunos caso identifique dificuldades neles em estabelecer conexões entre fato e teoria surgidas em seus discursos; (iv) ter o tempo definido para cada etapa da atividade e estar atento ao seu controle; (v) pesquisar casos e exemplos recentes de situações que podem ilustrar e facilitar a compreensão do caso e de argumentações propostas durante as atividades; (vi) preparar uma síntese de toda a discussão proposta na aula por meio da organização do raciocínio jurídico empregado por seus alunos, estabelecendo relações com o tema e conteúdo da aula. 

 

PREPARAÇÃO PRÉVIA DE ESTUDANTES:  O aluno deverá: (i) ler todo o material disponível para a aula e refletir criticamente a seu respeito; (ii) formular questões que possam refletir dúvidas sobre o material lido e apresentá-las em sala de aula durante as discussões; (iii) quando for o relator do processo, redigir um voto de até cinco páginas a partir do relatório disponibilizado pelo professor e entregá-lo em data determinada, além de preparar a apresentação do voto a ser feita no dia da aula; (iv) quando for Amicus Curiae, redigir um parecer em até cinco páginas e entregá-lo ao professor em data determinada; (v) quando for participante de audiência púbica, preparar um parecer e entregar ao professor em data determinada, além de preparar uma apresentação a ser feita no dia da aula; (vi) quando for responsável pela apresentação do seminário temático, redigir um fichamento do texto de, no máximo, três páginas, e entregar ao professor no dia da aula. 

 

INTRODUÇÃO DA DINÂMICA: A aula era dividida em dois momentos: uma prática simulada de casos já apreciados pelos ministros do STF e outro com a apresentação de seminários abertos ao debate sobre textos que discutiam a dinâmica decisória dos ministros via pesquisas bibliográficas, documentais ou empíricas. Durante a prática simulada, os alunos, participando ativamente do debate, teriam a oportunidade de desenvolver a fluência de sua retórica e oralidade, por meio do reconhecimento dos principais pontos conflitantes no caso disposto para análise. Desta forma, os alunos poderiam se tornar capazes de visualizar diferentes resoluções cabíveis ao deslinde do caso concreto, bem como as suas possíveis consequências políticas, jurídicas ou até mesmo sociais. Além disso, eram objetivos da disciplina: estimular a percepção dos alunos sobre o quanto as suas moralidades, crenças pessoais e experiências de vida são capazes de interferir na produção de um argumento jurídico, além de demonstrar as dificuldades que um julgador possui em proferir uma decisão judicial com a imparcialidade requerida pelo sistema normativo.

A metodologia proposta foi a do estudo de casos com a utilização de um role-playing. A sala de aula foi organizada de forma a simular julgamentos de casos concretos apreciados pelo Supremo Tribunal Federal, permitindo aos alunos que, por meio do estudo de um caso, pudessem construir um raciocínio jurídico-constitucional. A metodologia foi focada no estímulo à argumentação e à construção deste raciocínio jurídico-constitucional sem perder de vista a análise dos fatos para que, a partir deles, os alunos pudessem identificar as principais questões jurídicas, políticas e institucionais por trás da decisão judicial. No segundo momento da aula os seminários eram utilizados de modo a estabelecer um estranhamento com os alunos acerca das práticas ocorridas na simulação de julgamento. Assim, era possível construir um ambiente em que o exercício do contraditório pudesse ser destacado e, posteriormente, o que o ambiente gerado pelo campo de disputas existente no Direito seria capaz de mascarar, como fatores fundamentais que influenciariam tanto a tomada de decisão do magistrado quanto a construção dos argumentos das partes envolvidas no caso. Para lidar com esta dinâmica decisória e enfrentar questões que influenciassem diretamente no julgamento, a aula seguiu a lógica abaixo descrita.

 

DESENVOLVIMENTO DA DINÂMICA: 

As aulas seguiam, em seu primeiro momento, simulações de julgamentos do Supremo Tribunal Federal. No primeiro dia de aula foi feita uma explicação da dinâmica da aula e das formas de avaliação. No segundo, foi feito um mapeamento da turma a fim de fazer as adequações necessárias no que se referia ao quórum de alunos para que fosse possível o desenvolvimento da proposta metodológica a seguir.

Na aula anterior eram sorteados alunos que teriam funções específicas na sessão simulada: proferir relatório e voto do caso, fazer sustentações orais defendendo determinado ponto de vista etc.; cada um deles teria que enviar um trabalho escrito, no prazo estipulado. Os principais atores de uma sessão de julgamento no STF eram representados. O relator do caso tinha o dever de, por meio do relatório disponibilizado no material de aula, elaborar um voto escrito a ser enviado no prazo estipulado para o professor. Os votos escritos somados à apresentação corresponderiam a uma das notas da disciplina.

Em algumas das sessões, surgiam alguns outros atores, como o Amicus Curiae ou um representante de algum grupo de interesse que se manifestasse em uma Audiência Pública. O Amicus Curiae tinha a função de defender um ponto de vista em favor de uma das partes, com argumentos característicos à instituição a qual fizesse parte, assim como os representantes de possíveis grupos de interesse que compusessem uma audiência pública. Estes atores deveriam se manifestar com um parecer a ser apresentado também no dia do julgamento, mas antes do voto do Relator. O parecer deveria ser entregue ao professor e ao relator também no prazo estipulado, para que o último tivesse acesso ao parecer antes de elaborar o seu voto.

De forma ainda mais detalhada a que foi inerida no primeiro formulário de inscrição, no dia da aula era dado início à dinâmica com uma abordagem geral do caso e dos temas que seriam enfrentados em sala de aula, de no máximo 10min, com o cuidado de alertar os alunos para algumas das questões com que deveriam se preocupar durante o debate e julgamento. Em seguida, uma breve apresentação da causa era conduzida pelo Relator em até 5min e, depois, e quando houvesse, eram feitas as manifestações de amicus curiae por até 15 min para, posteriormente, serem expostas as sustentações orais com as manifestações de voto do relator e demais ministros (10min para cada uma das partes e 10min para o Ministro Relator). Durante a apresentação dos votos, o professor poderia fazer breves análises demonstrando a preocupação que cada um teve e a contextualização
com o problema que estava sendo enfrentado.

Por fim, a sessão simulada estaria aberta às intervenções de cada um dos alunos, onde cada um também representaria um ministro, com falas de até 2min cada, limitadas ao prazo máximo da primeira parte da aula de 1h30min. As interlocuções eram devidamente mediadas pelo professor, ponderando cada uma delas e alertando às preocupações do interventor com o argumento levantado. Os alunos presentes proferiam seus votos apresentando oralmente os seus argumentos. A cada argumento diferente levantado o professor, na função de mediador, abordaria as questões constitucionais envolvidas que foram ou deveriam ter sido levadas em consideração no momento do voto. Findo o julgamento, e computados os votos de cada um dos presentes, o professor fazia uma análise mesmo que breve do julgamento em até 5min, apontando questões que foram levadas em consideração na apreciação do caso concreto.

 

ENCERRAMENTO: 

Na segunda metade da aula, e a partir da divisão anterior da turma em grupos, cada um deles era responsável por apresentar um texto de leitura obrigatória em no máximo trinta minutos. No dia da apresentação, o grupo teria que entregar um fichamento ao professor e disponibilizá-lo, após a apresentação, na pasta Dropbox criada especificamente para a disciplina. O objetivo do segundo momento da aula era observar e analisar criticamente a simulação de julgamento, com o destaque ao que poderia ser um dos fatores de influência tanto na dinâmica decisória dos ministros quanto na construção do raciocínio argumentativo de cada um dos atores envolvidos na demanda. Foi disponibilizado um tempo de até 30min para interlocuções de todos os interessados em participar ativamente do seminário.

Isto é, o segundo momento era destinado ao exercício de desconstrução de todo o debatido na simulação dos julgamentos. Os alunos destacavam o contexto histórico-político de julgamento, as relações pessoais estabelecidas pelos atores no julgamento, experiências anteriores ao julgamento obtidas por seus atores, vínculos que demandassem determinados posicionamentos, dentre outras questões. Os textos de leitura obrigatória eram utilizados como suporte a tais discussões e foram selecionados sempre a partir de alguma pesquisa realizada, de natureza bibliográfica, documental ou empírica, em que fosse possível estabelecer uma relação mínima com o caso discutido em sala de aula, estabelecendo um estranhamento com o mesmo. O exercício de desconstrução tinha como principal objetivo estimular nos alunos um olhar mais apurado acerca do distanciamento ocorrido entre o pensamento normativo, desenvolvido nas sessões simuladas de julgamento, e o funcionamento da realidade social – olhar obtido a partir dos alertas que pesquisas que têm como foco o conhecimento e compreensão da realidade que possuem. Por fim, o professor se utilizava de até 30min para contextualizar toda a discussão ocorrida na aula, estabelecendo conexões com o conteúdo da aula e as dinâmicas ocorridas.

Para cada uma das aulas eram disponibilizados: caso gerador constando uma descrição breve do caso a ser estudado; relatório do caso com trechos selecionados para leitura; textos de leitura obrigatória e complementar; reportagens e entrevistas. Os casos selecionados para discussão em sala nas sessões simuladas de julgamento foram escolhidos a partir da repercussão social que alguns tiveram, além da relação capaz de estabelecer com os temas propostos para discussão. Vejamos: (i) Impeachement do Presidente Collor: MS/DF 21.564-0; (ii) Lei de Anistia: ADPF n. 153; (iii) Raposa Serra do Sol: Pet. 3.388; (iv) Desuso da competência do Senado (mutação constitucional do art. 52, X da CF/1988): Recl. 4335-5/AC; (v) Caso Elwanger: HC 82.424/RS; (vi) Reconhecimento da união homoafetiva: ADI 4.277; (vii) Interrupção de gravidez de feto anencefálico: ADPF nº. 54/DF; (viii) Ficha limpa: ADI nº. 4.578/DF; (ix) Mensalão: AP 470; e (x) Fundo de Participação dos Estados: ADI 1.987.

Em cada um dos casos apreciados foi destacado na literatura mais recente, um texto de leitura obrigatória e/ou complementar que pudesse discutir as questões jurídicas, políticas ou sociais que cada caso demandava. Alguns textos apresentavam discussões acerca do contexto histórico-político de julgamento, outros faziam uma análise comportamental dos julgadores, análises teóricas, doutrinárias, de documentos oficiais etc. O fundamental era que o texto servisse de suporte à reflexão sobre como a produção do conhecimento jurídico ocorre no campo de disputa travado por seus atores.

Para cada aula eram selecionados casos e textos que melhor se adequassem aos temas indicados para discussão em sala. E todo o material para leitura era disponibilizado em pasta compartilhada em nuvem e em uma pasta na copiadora da faculdade de Direito, além do plano de curso da disciplina ter sido igualmente disponibilizado aos alunos para um acompanhamento integral da disciplina ao longo de todo o curso.

Avaliação: 

A avaliação será feita da seguinte forma:

(a)    correção dos votos escritos dos alunos que terão, em algum momento, sido Relator ou Revisor; e dos pareceres, caso surja a figura do Amicus Curiae, por exemplo na prática simulada - 30% da nota;

(b)    Atuação na prática simulada – 20% da nota;

(c)    Atuação nos seminários: apresentação, 30% da nota; e respostas aos questionamentos feitos durante a apresentação, 20% da nota.

Observações: 

A criação da disciplina nos moldes aqui descritos permitiu inúmeras reflexões sobre o ensino do Direito a partir do olhar especialmente atribuído ao direito constitucional. Como exemplo, por meio da leitura obrigatória, além das dinâmicas, interações e reflexões ocorridas em sala de aula, a discussão sobre “como os ministros decidem” estimula nos alunos a percepção acerca do empenho intelectual empregado pela doutrina jurídica em racionalizar comportamentos não observáveis, além da insuficiência de elementos para investigar o que a própria doutrina sugere como sendo a realidade social. Com a identificação de fatores institucionais e sociais, somados aos jurídicos, capazes de influenciar a tomada de decisão, como escolha de assessores, clamor popular, influência midiática, alto volume de processos e impossibilidade de atribuir especial atenção a cada um deles, dentre outras questões, os alunos são capazes de perceber a necessidade de readequação ao problema de pesquisa, como a mudança da pergunta feita por quem dedica estudos à análise ao processo decisório: em vez de investigar “como os ministros decidem?”, seria mais provocativo investigar “como as decisões são produzidas?”.

A mudança da pergunta no exemplo acima indica alguns efeitos que a abordagem do direito constitucional aqui proposta pode ter, como a distinção de como o campo jurídico é lido pela doutrina e como ele funciona ou como seus atores dizem que ele efetivamente é. Apenas a identificação desse cenário permite a compreensão de possíveis inconsistências no sistema de ensino do Direito no Brasil, e, por que não, no sistema jurídico brasileiro. E a disciplina nos moldes propostos pode servir de laboratório à investigação de todas estas questões, que precisam ser claramente separadas e analisadas de formas distintas.

Compreender o Supremo Tribunal Federal como um órgão não sagrado, atestar a falta de racionalidade jurídica no uso de categorias (constitucionais ou não), entender o processo de constitucionalização do discurso como meio de empoderá-lo e superar o argumento alheio, reproduzir teses como meio de legitimação de conhecimento técnico-jurídico, ser citado para aumento de prestígio e elevação de status na carreira, buscar referências nas profissões jurídicas tradicionais, tecer leituras esquematizadas facilitadoras de estudo para concursos ou OAB, dentre outros, são alguns dos elementos que permitem a distinção de como o campo jurídico é lido e ensinado nas salas de aula para como funciona na sociedade, o que é fundamental para compreendê-lo e, consequentemente, estimular o seu ensino mais reflexivo nas salas de aula das graduações brasileiras.

O estranhamento, relativização e desnaturalização sugeridos pelas dinâmicas propostas na disciplina são simples de serem realizados, existindo alguns instrumentos hábeis ao estímulo desse processo, como a pesquisa, por exemplo. A pesquisa deve ser vista como uma ferramenta capaz de proporcionar ao estudante de Direito o desenvolvimento de competências e aprimoramento de habilidades que atualmente são instrumentais ao saber; como a capacidade de conhecer o próprio meio ao qual está inserido e propor soluções singulares e adequadas às suas reais demandas. Para tanto, mais que observador, é preciso ser participante, características possíveis de serem desenvolvidas a partir do estímulo à produção de pesquisas no seio da universidade.

Isso porque a imersão no campo jurídico tão somente a partir da normatividade, conforme proposto pelo ensino tradicional do Direito, pode representar não apenas uma preparação e adequação às demandas do mercado de trabalho tal qual as graduações em Direito argumentam, mas também uma postura pouco comprometida com a formação do estudante ao menosprezar o desenvolvimento de habilidades de pesquisa. Não se está afirmando aqui que as faculdades de Direito do país devessem oferecer, em sua formação, o desenvolvimento da capacidade de pesquisadores em seus alunos, além do oferecimento do “título” de juristas. Mas o compromisso a ser assumido na nova formação do estudante de Direito é o de possibilitar o aprendizado de uma ferramenta que contribua ao aprimoramento de habilidades específicas no estudante, como: a observação e compreensão da sociedade em que vivem.

Por fim, cabe o destaque que a disciplina aqui descrita não deve apenas ser entendida como uma proposta diferenciada de mediação da produção do conhecimento em sala de aula, mas um convite à reflexão sobre o modo como o ensino do direito é estruturado no Brasil a partir do enfrentamento de questões como: (i) o desenvolvimento de um novo pensamento na formação acadêmica do estudante de Direito a iniciar pelos projetos político-pedagógicos das instituições de ensino; (ii) a disponibilidade de professores e gestores do ensino para investirem tempo em aperfeiçoamento, especialmente em aspectos metodológicos; (iii) a disposição docente para abrir mão do protagonismo em sala de aula e a consequente transformação dos alunos como parte ativa no processo de produção do conhecimento; (iv) a cooperação e troca de experiências docentes a partir da criação de redes e espaços destinados especificamente a este fim; (v) a possibilidade de maior abertura de diálogo com outras áreas do saber, como a política, economia, sociologia, antropologia, dentre outras; além de outras questões pedagógicas, políticas e sociais que merecem igual consideração neste processo. Para uma melhora do estudo e ensino do direito no Brasil não basta decifrar e discutir pensamentos e ideias, é preciso conhecer, refletir, compreender e, sobretudo, mudar práticas.

 

SUGESTÕES DE ATIVIDADES DE “CONSOLIDAÇÃO” A SEREM DESENVOLVIDAS PELOS ALUNOS (ATIVIDADES EXTRACLASSE): Até um dia após cada uma das aulas, os alunos responsáveis por redigir votos, pareceres, além dos grupos responsáveis pelo seminário temático e que produziram os fichamentos dos textos apresentados, deverão disponibilizar todo o material escrito na pasta Dropbox da turma.

 

CUIDADOS A SEREM OBSERVADOS: O professor deve ter o cuidado especial de não desprezar o olhar dos alunos diante do exercício do contraditório. Isso porque a lógica da superação de argumentos não pode se afastar da análise do caso concreto, bem como das possíveis consequências políticas ou jurídico-constitucionais de determinada decisão judicial. Além disso, (i) o controle do tempo de cada uma das atividades, (ii) o estímulo à leitura a partir de uma breve introdução feita uma aula antes do texto ser trabalhado, (iii) a habilidade em controlar e direcionar o debate, e (iv) sintetizar as principais discussões, atribuindo sentido a todas elas, conectando ao tema e conteúdos trabalhados são fundamentais ao sucesso da atividade e disciplina.

Detalhes da atividade

Nome: 

Na pele dos ministros: a construção dos votos no Supremo Tribunal Federal

Instituição: 

Faculdade de Direito da Universidade de Brasília

Área de concentração: 

  • Direito Constitucional

Curso: 

  • Graduação

Palavras-chave: 

  • Supremo Tribunal Federal
  • STF
  • Voto
  • Decisão
  • Pesquisa empírica
  • Direito Constitucional.

Número de alunos: 

30

Tempo de aplicação: 

+30h

Edição: 

Tatiane Guimarães

Direitos autorais

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